Uma obra que se arrasta há quase dois anos no Cemitério Municipal da Saudade, no bairro homônimo, na Região Leste de Belo Horizonte, está parada desde dezembro para ajustes contratuais e aguardando aditivos de valor, mas aumenta ainda mais a angústia de quem precisa sepultar um parente ou amigo. Os quatro velórios estão interditados para reforma e outros cinco precisam ser concluídos. Os corpos são velados em locais distantes, o que gera transtorno com o deslocamento. Ontem, um corpo foi velado numa funerária particular do Bairro Santa Efigênia e outro em uma igreja evangélica do Alto Vera Cruz, ambos na Região Leste. Segundo a Fundação Municipal de Parques, o orçamento inicial da obra foi de R$ 3,5 milhões. A Superintendência de Desenvolvimento da Capital (Sucecap) não informou se há previsão de retomada da obra.
O Saudade é a segunda necrópole municipal mais antiga da capital. Foi construído em estilo clássico, em 1942, para atender à população de baixa renda que desejava um jazigo perpétuo. O mais antigo é do Bonfim, na Região Noroeste, inaugurado em 8 de fevereiro de 1897, que sempre atendeu famílias de maior poder aquisitivo.
Em sete meses, a aposentada Tereza Mendes, de 62, viveu o drama de velar mãe e irmão longe do local do sepultamento. No caso da mãe, foi preciso contratar o espaço de uma funerária particular no Santa Efigênia para fazer o velório. Ontem, ela sepultou o irmão e também precisou recorrer à funerária, onde o corpo passou a madrugada em local fechado. O irmão morava a um quarteirão do Cemitério da Saudade e muita gente que o conhecia não foi ao velório por depender de transporte. “Não tinha outro jeito de fazer o velório. Ofereceram para a gente os velórios do cemitério do Bonfim e o da Paz, mas eles ficam do outro lado da cidade”, reclama Tereza. “Tivemos que fazer dois deslocamentos com o corpo. É uma muita humilhação com a gente”, comentou.
O aposentado Antônio Francisco dos Santos, de 70, mora na rua do Cemitério da Saudade e conheceu o irmão de Tereza desde pequeno. “Fui de carro ao velório e não consegui lugar para estacionar. Se fosse velado no cemitério, era só atravessar a rua. Prometeram essa obra para a Copa do Mundo e ficaram enrolando”, denuncia o aposentado, lembrando que o Saudade é o único cemitério da Região Leste e as pessoas preferem sepultar seus mortos perto de casa.
Outro problema, segundo o aposentado, é o tumulto no trânsito provocado pelos carros que acompanham o cortejo fúnebre e que chegam todos ao mesmo tempo. “São muitos carros e ônibus fretados e o trânsito fica parado. Se os velórios do cemitério estivessem prontos, os carros iriam chegando aos poucos”, reclama.
O chefe de Divisão de Necrópoles José Chagas Diniz Couto, responsável pela administração do cemitério, informou que a obra inclui uma lanchonete com floricultura, um portal de entrada, onde fica uma guarita de vigilância, e ainda a construção do almoxarifado, prédios que já foram concluídos, mas não inaugurados. O prédio da administração também será reformado, segundo ele. Para o aposentado Antônio Francisco, a prefeitura deveria ter dado prioridade à reforma e construção dos velórios, para facilitar a vida de quem já está sofrendo pela perda de um ente querido: “Fizeram primeiro a lanchonete, mas ela está fechada?”
TAXAS Mesmo sendo municipal, o sepultamento de um corpo nas quatro necrópoles da prefeitura não sai barato. A taxa de velório custa R$ 127,72 no Cemitério da Saudade; no da Paz, R$ 182,65; no Consolação, R$ 127,72, e no Bonfim são dois preços: R$ 482,68 e R$ 359,65. Há também taxa de sepultamento, que no Saudade é de R$ 182,65. Quem decide por uma sepultura perpétua paga taxa anual de conservação do cemitério de R$ 62, mas a conservação e manutenção do mausoléu são da família do morto. Por isso, muitos mausoléus estão abandonados. A taxa de exumação do corpo é de R$ 182,65.
Quando se trata de sepultamento de pessoas especiais, como são chamados indigentes e de famílias com atestado de pobreza, a Santa Casa faz todo o serviço de graça, com urna, flores e velório. Mas a família deve procurar o serviço social da Regional para se declarar pobre.
CANGAÇO Diferentemente do Cemitério do Bonfim, que tem celebridades sepultadas , como o ex-presidente da República Olegário Maciel e o ministro da Marinha Raul Soares, talvez os restos mortais mais ilustres do Cemitério da Saudade sejam do irmão do cangaceiro Virgulino Ferreira, o Lampião. No túmulo, o ex-cangaceiro Antônio Inácio da Silva, o Moreno, aparece na fotografia ao lado da mulher, Durvalina Gomes de Sá, a Durvinha, que também fez parte do bando de Lampião. O casal viveu o resto de suas vidas em BH. Durvinha foi sepultada em outro cemitério da cidade, mas seus restos mortais foram levados para junto do companheiro, no ano passado. O pedido foi feito à PBH pela filha do casal, Neli Maria da Conceição, e o município doou o túmulo ao reconhecer a relevância histórica dos ex-cangaceiros. “Moreno e Durvinha. Sangue, amor e fuga no cangaço”, diz a placa, sem mais informações. “Moreno foi sepultado em cova comunitária. Em 2012, a prefeitura cedeu um espaço melhor para os restos mortais”, disse Couto.
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