quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Audiência criminal é filmada

O Judiciário definiu no início do mês as metas para 2011. Além de acelerar a implantação do processo eletrônico, principalmente na Justiça Federal, os 91 tribunais do país pretendem utilizar sistema de registro audiovisual de audiências em pelo menos uma vara de cada um deles.

A ferramenta já é utilizada em várias unidades de primeira instância do país. A ideia do Judiciário é padronizar o procedimento. Em Rio Branco, o juiz Cloves Augusto, da 4ª Vara Criminal, já usa uma câmera digital em audiências desde 2008. O magistrado é fã de tecnologia e inovou ao ouvir uma vítima de roubo e extorsão por meio do viva-voz de um celular. Além disso, instituiu no fim de agosto que as intimações de audiências de suspensão condicional de processos passassem a ser feitas por telefone.
"Não digitamos mais. Ligamos a câmera por controle remoto e iniciamos o julgamento", disse o juiz. De acordo com o magistrado, o uso da ferramenta traz mais agilidade à audiência, pois os advogados podem dirigir as perguntas diretamente às testemunhas. "Não é preciso mais a minha intervenção e a reprodução do que foi dito ao escrivão." Finalizado o caso, um DVD é anexado ao processo. "Em caso de recurso, um desembargador pode assistir o DVD e analisar o comportamento da pessoa que está falando", afirmou Cloves Augusto que, normalmente, encerra seus casos em apenas uma audiência.
Se a ferramenta agiliza audiências na primeira instância, pode trazer transtornos a desembargadores, em caso de recurso. "Uma coisa é ler os resumos de depoimentos de testemunhas. Outra, é assistir toda a audiência, que pode ter durado 15 minutos ou três horas", disse o juiz auxiliar da Presidência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Antonio Carlos Alves Braga Junior. "Isso justifica a implantação de unidades-piloto para experimentação. O registro integral em áudio e vídeo parece inevitável. As conveniências justificam. Precisamos apenas padronizar o procedimento." (AR)

Skype e e-mail ajudam a acelerar julgamentos

O advogado Guilherme de Carvalho Doval, do escritório Almeida Advogados, ficou surpreso com um recente despacho da juíza Mônica Libânio Rocha Bretas, da 34ª Vara Cível de Belo Horizonte, publicado no Diário da Justiça. No texto, a magistrada solicita os e-mails dos profissionais que atuam em uma disputa judicial entre uma construtora e uma transportadora, pois enviará, por meio eletrônico, a íntegra das decisões às partes. "É uma prática incomum. Isso poupa deslocamentos para ciência de decisões", disse Doval.

Com o uso do e-mail, a magistrada, além de facilitar a vida de advogados, quer reduzir o número de pessoas no balcão da secretaria da vara e, consequentemente, reduzir o tempo de tramitação dos processos. A utilização de ferramentas da internet e outras tecnologias para driblar burocracias e agilizar os julgamentos é cada vez mais comum, principalmente entre jovens juízes. Alguns tribunais montaram grupos para avaliar e propor a expansão de práticas inovadoras, que devem respeitar a legislação. "O envio da mensagem não pode ser usado para início de contagem de prazo", afirmou o advogado Alexandre Atheniense, ex-presidente da Comissão de Tecnologia da Informação da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Hoje, de acordo com o conselheiro Walter Nunes, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), cerca de 70% do tempo da tramitação dos processos na Justiça é gasto com atos cartorários - autuações e juntadas, comunicações processuais, numeração e certificações. "O problema crônico do Judiciário é a burocracia", disse o conselheiro durante o 4º Encontro Nacional do Judiciário, realizado recentemente no Rio de Janeiro. No evento, ele abordou a importância do processo eletrônico para combater a morosidade na Justiça. "O processo eletrônico resolve todos esses problemas."
Enquanto caminha a implantação do processo eletrônico em todo o país, magistrados vão usando a criatividade para resolver problemas em suas comarcas. No Acre, o juiz Edinaldo Muniz dos Santos, então titular da Vara Criminal de Plácido de Castro, usou um torpedo de celular para proferir uma sentença e expedir alvará de soltura para um devedor de pensão alimentícia. O magistrado estava em Rio Branco quando foi informado pelo cartório que o débito havia sido quitado. Imediatamente, postou a mensagem. "Pago o débito, declaro extinta a execução. Esta, certificada, deverá servir de alvará em favor do executado", afirmou no torpedo o juiz que, posteriormente, enviou um e-mail para libertar outro devedor de pensão alimentícia.
Se não fosse a mensagem eletrônica enviada pelo magistrado no dia 24 de dezembro do ano passado, o devedor passaria o Natal na cadeia, em uma cela em Rio Branco. Edinaldo Muniz dos Santos trabalhava no plantão, quando recebeu, por e-mail, requerimento do advogado do réu para expedição de alvará de soltura. "Não são práticas rotineiras. Mas podem ser usadas em emergências", disse o juiz, hoje titular da Vara Cível da Comarca de Sena Madureira (AC).
Em Igrejinha, no Rio Grande do Sul, o juiz Vancarlo André Anacleto também inovou ao ouvir, por meio do Skype, um estudante que estava na Hungria, réu em uma ocorrência de trânsito. Pouco antes de iniciar um intercâmbio, ele foi flagrado dirigindo em estado de embriaguez. "O pedido foi feito pelo advogado do réu. Eu concordei, já que não haveria prejuízo para o processo", afirmou o magistrado, que também toca um projeto-piloto de filmagem de audiências, aprovado pelo Tribunal de Justiça gaúcho. "O Judiciário tem que utilizar todas as tecnologias possíveis para acelerar a tramitação de processos."

Ministra mantém arquivada ação contra lei de Curitiba sobre serviços funerários

A ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Cármen Lúcia Antunes Rocha manteve arquivada a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF 202) ajuizada pelo PTB com o objetivo de assegurar que empresas permissionárias do serviço funerário da região metropolitana de Curitiba pudessem atuar livremente na cidade, quando os serviços destinam-se a famílias residentes em outros municípios. A ação questiona a Lei municipal 12.756/2008.
A ministra já havia determinado o arquivamento do processo em dezembro de 2009, mas o PTB recorreu do entendimento dela. Desta vez, a ministra explicou que o recurso não pode ser conhecido porque seu autor, o Diretório Municipal do PTB, não legitimidade para atuar na causa.
“Fica clara a ilegitimidade do agravante (o autor do recurso), pois o controle concentrado de constitucionalidade – um de cujos instrumentos é a ação de descumprimento de preceito fundamental – não é conferida aos Diretórios Regionais de partidos políticos”, afirma a ministra em sua decisão.
Em 2009, ela arquivou o processo porque a Associação dos Estabelecimentos de Serviços Funerários dos Municípios da Região Metropolitana de Curitiba (Asfumm), também autora da ação, ajuizou outro processo – uma ação civil pública – para contestar a lei municipal.
A lei que regulamenta a forma de processo e julgamento da ADPF determina, no parágrafo 1º do artigo 4º, que “não será admitida arguição de descumprimento de preceito fundamental quando houver qualquer outro meio eficaz de sanar a lesividade”. 
Segundo afirmou a ministra na decisão de dezembro 2009, a ação civil pública da associação demonstra “a existência, pelo menos em tese, de outra medida processual cabível e efetiva para questionar (a lei municipal)”.
A ministra Cármen Lúcia realçou, ainda, que o pedido da entidade buscava atender apenas o “interesse singular de empresas associadas”, não se adequando ao instrumento jurídico da ADPF, classificada por ela como “importante instrumento do sistema brasileiro de controle de constitucionalidade”.
Serviços funerários
A lei municipal contestada na ADPF exige a contratação de empresas integrantes do serviço funerário do município de Curitiba, permitindo apenas a contratação de funerárias sediadas em outras localidades quando o velório e o sepultamento ocorrerem fora da capital, mesmo que a funerária esteja situada na região metropolitana.
A ação registra que, até o surgimento da Lei municipal 12.756/2008, as associadas da Asfumm realizavam entre 30% a 40% dos serviços ocorridos na capital, transitando por Curitiba, relativamente a pessoas a serem sepultadas em municípios da região metropolitana e outros que não a capital, conforme Relatório Diário de Serviços emitido pelo município. Após a edição da lei, as associadas passaram a executar menos de 10% dos serviços.

Um alerta sobre bolha no crédito

O crédito bancário cresce acima da média histórica no Brasil e isso exige que os bancos brasileiros tenham um colchão de capital maior para enfrentar incertezas e cobrir eventuais perdas quando a economia desacelerar. É o que recomenda o Comitê de Basileia em documento sobre regras prudenciais para evitar nova crise bancária mundial. O Comitê examinou o crédito nas 26 principais economias do mundo e concluiu que o Brasil é um dos países com maior aquecimento no mercado de crédito, junto com Coreia do Sul e Cingapura.
Se a recomendação do Comitê for obedecida ao pé da letra, o Brasil terá de impor uma exigência extra de capital aos bancos equivalente a 2,5% dos ativos ponderados pelo risco. Hoje, o padrão internacional é de 8% e, no Brasil, de 11%, valores que estão sendo revistos.
O documento adiciona mais um ingrediente ao debate sobre o eventual superaquecimento do mercado de crédito no Brasil, que poderia levar à criação de bolhas. Nos últimos cinco anos, o crédito bancário ao setor privado saltou de 26,6% do PIB para 45,3%.
Segundo o Comitê , cabe a cada país fazer um exame de sua realidade para determinar o volume de capital para lidar com riscos cíclicos, mas usando os cálculos do Comitê como ponto de partida. O Banco Central do Brasil entende que a metodologia do Comitê não é suficiente para analisar um mercado de crédito que passa por transformação estrutural, como o brasileiro.
O Comitê de Basileia é um organismo que cria regras para manter a solidez do sistema bancário mundial. Era um clube restrito aos países ricos até que a crise bancária levou à admissão de novos sócios, incluindo o Brasil. Nos últimos anos, a instituição discute novas regras para fortalecer o sistema bancário, conhecidas como Acordo de Basileia 3. Os acordos anteriores, Basileia 1 e Basileia 2, não foram suficientes para evitar que os bancos assumissem riscos excessivos que levaram à crise. Em geral, os bancos expandem muito o crédito quando as economias crescem e acabam negligenciando os riscos da desaceleração.
Na quinta-feira, o Comitê divulgou documento que aponta quanto o crédito em cada país está aquecido, para então determinar o capital extra que os países deverão manter para enfrentar o risco de recessão. No caso brasileiro, em 2009 o volume de crédito estava cerca de 14% do PIB acima do que era de se esperar se os empréstimos seguissem sua tendência histórica.

Vivos e mortos compartilham espaço em cemitério de Manila



Viver entre mortos é uma questão de sobrevivência para as famílias filipinas que se amontoam em barracos construídos sobre os túmulos do cemitério de Navotas, em uma das áreas mais pobres de Manila.
Centenas de pessoas moram neste lugar por conta da falta de recursos para encontrar uma vaga no imenso labirinto de favelas que rodeia a capital.
 
Virgínia, viúva de 51 anos, vive há três décadas sobre uma fila de estruturas de cerca de cinco metros de altura sobre as quais se amontoam dezenas de habitações construídas com tábuas de madeira, lonas e papelão.
 
Do alto, é possível contemplar as ruas da comunidade delimitadas por fileiras de túmulos e o lixo cobrindo quase toda a área, exalando um cheiro nauseabundo ao qual os moradores parecem ter se acostumado.
"Quando cheguei era pior, havia mais lixo e o mar chegava até aqui. Mudamos para cá porque podíamos ficar perto do mar e ganhar dinheiro. Não havia mais espaço", diz a lavadeira da ilha de Samar, no leste do país.
 
A área habitada do cemitério é a mais próxima da baía de Manila, que conta com uma das águas mais poluídas do mundo mas que, no entanto, proporciona sustento para milhares de pessoas que trabalham em um porto próximo recolhendo moluscos ou pescando alguma espécie marinha capaz de sobreviver ao ambiente hostil.
 
Arnold, 22 anos, se mudou para Navotas para ganhar dinheiro para sustentar os três filhos. "É um lugar muito sujo e em algumas semanas, assim que eu economizar o suficiente, volto para minha casa", relata o jovem, que faz coleta de mexilhões.
 
Enquanto se move com a habilidade de um acrobata pelas fileiras de túmulos, Arnold observa crianças descalças que em meio a uma nuvem de moscas procuram comida em uma montanha de lixo que também é disputada por galinhas e seus pintinhos.
 
"Algumas vezes aparecem esqueletos de mortos entre o lixo, que pertencem aos túmulos que já foram esvaziados", explica o jovem.
 
Em um país onde a onipresente religião católica convive com a proliferação de superstições pagãs, o fato de compartilhar o dia a dia com cadáveres não parece inquietar os habitantes da área.
 
"No começo, quando me mudei, tinha um pouco de medo que tivessem espíritos, mas agora não tenho mais", diz Anna, de 29 anos, que há dois anos se mudou para Navotas para morar com seu marido.
 
"Prefiro viver aqui porque todo mundo é feliz, tenha dinheiro ou não", avalia a mulher.
 
A vida cotidiana se assemelha à de todos os outros bairros pobres da capital filipina. Alguns jovens passam as horas jogando basquete, outros se entretêm com partidas de bilhar e de cartas, e as crianças, quando não brincam entre a sujeira, estudam na escola financiada pela Philippine Christian Foundation, uma organização local.
 
As pessoas que moram em cima dos túmulos são as mais pobres do lugar, que não têm condições de pagar o aluguel de 800 pesos mensais (US$ 18), o custo para construir um barraco em outras áreas do cemitério nas quais o risco de que a casa afunde por conta do peso é menor.
 
Em uma dessas minúsculas habitações de um só quarto, Inma, de 36 anos, criou seus oito filhos com a ajuda de seu marido, que trabalha como estivador no porto.
 
Enquanto lava a roupa de outros moradores em troca de alguns pesos, ela explica que seu filho mais velho tem 20 anos e traz dinheiro para a casa com a venda dos peixes que consegue pegar, e como muitos outros de seus vizinhos, assegura que nunca pensou em se mudar.

"A gente se ajuda muito e ninguém é egoísta e é isso que me faz gostar mais de viver aqui, por isso não penso em ir para outro lugar", diz.