sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

O avanço da penhora on-line no STJ

 

 

A Lei nº 11.382 de dezembro de 2006 chancelou a possibilidade do bloqueio de recursos em contas dos devedores por meio eletrônico (a famigerada "penhora on-line"). Tal medida já vinha sendo realizada desde 2001, dado o convênio entre o Banco Central, Superior Tribunal de Justiça (STJ) e Conselho da Justiça Federal, que desde aquela época permitira tal forma de penhora (posteriormente aprimorado no sistema Bacen Jud 2.0).
Mesmo com os avanços da penhora on-line, que de fato imprimiram maior efetividade às execuções, há muitos que atacam tal sistema sob diferentes justificativas, como se criar mecanismos legais, céleres e efetivos de cobrança do devedor fosse ato grave de expropriação patrimonial, ferindo o sigilo bancário etc.
Com todo o respeito às posições divergentes, entendemos que, na grande maioria dos casos, as críticas ao uso do Bacen Jud não merecem prosperar. Primeiramente, no que tange à suposta "ofensa ao sigilo bancário", frise-se que a ordem de bloqueio apenas indica se o valor executado está disponível em contas ou aplicações, não revelando quaisquer outras informações do devedor. Quanto à questão das ordens judiciais que afetam simultaneamente várias contas, e, portanto, acarretam o bloqueio em indevida pluralidade, salienta-se que há hoje a opção de cadastro de conta única para tal finalidade (Resolução nº 61/2008, CNJ), contornando tal problema. Cabe lembrar, ainda, que as ordens de bloqueio não podem partir de arbitrariedades, mas sim de decisões fundamentadas e sem atingir montantes tidos como impenhoráveis (artigo 649 do Código de Processo Civil).
Por fim, não se pode deixar de lado o sucesso desse sistema - estima-se que entre 2005 e 2011 foram bloqueados nada menos que R$ 100 bilhões, por meio de mais de 24 milhões de solicitações - números estes muito significativos (fonte CNJ).
Na maioria dos casos, as críticas ao Bacen Jud não merecem prosperar
Com efeito, o Superior Tribunal de Justiça tem apreciado inúmeras controvérsias envolvendo a penhora on-line de forma paritária com a Constituição Federal e legislação aplicável, balizando seu uso ponderadamente. Dentre muitos julgados que trataram do tema, cumpre destacar nesta oportunidade (e em apertado resumo): o RESP nº 1.112.943-MA (15/09/2010). No caso, o STJ entendeu que atualmente não é necessário o credor comprovar previamente que esgotou todas as vias extrajudiciais para localizar bens do devedor, antes de pedir a penhora on-line. No RESP nº 1.182.820-RJ (22/02/2011), o STJ Corte decidiu que o ônus da prova de indisponibilidade dos recursos é do executado. Já no AgRg no RESP 1.184.025-RS (10/05/2011), os ministros da Corte entenderam que a penhora on-line não ofende o artigo 620 do Código de Processo Civil.
Na análise do RESP nº 1.229.329-SP (17/03/2011), o STJ julgou que pode-se penhorar o valor penhorado em conta conjunta mesmo que só um dos titulares seja responsável pelo débito. Pelo RESP 1.184.765-PA (24/11/2010), a Corte entendeu que é possível o arresto on-line (bloqueio mesmo antes de ser encontrado o devedor). Já no AgRg no Ag 1.230.464-RJ (08/02/2011) o resultado foi o de que mesmo havendo indicação de bens, é possível a penhora on-line a critério do julgador. Ao avaliar o RESP 1.275.682-MS (01/12/2011), o STJ consignou que não há quebra de sigilo bancário na penhora online. No RESP 1.231.123-SP (02/08/2012), o tribunal entendeu que poupança de até 40 salários mínimos é impenhorável mesmo que dinheiro esteja separado em várias contas. E por último, no RESP 1.284.587-SP (16/02/2012) o STJ julgou que a reiteração do pedido requer comprovação da alteração da situação econômica do devedor.
Entendemos assim, com todo respeito às posições contrárias, que o Superior Tribunal de Justiça tem cumprido plenamente a sua função de resguardar a legislação no tocante ao convênio, de grande importância para a busca da plena efetividade do processo civil brasileiro. O sistema, corretamente utilizado, só vem a trazer benefícios para a sociedade como um todo, em especial para os credores e bons pagadores (com melhores formas de cobrança coercitiva, logicamente reduz-se o risco de crédito). Nesse tocante, é pertinente citar a ministra Nancy Andrighi (no seu artigo "O nasceiro do prosônimo da penhora on-line"), reconhecendo um dos mais graves problemas de quem atualmente socorre ao Poder Judiciário, e concluindo que o referido instituto pretende "evitar a frustração nos processos de execução, mudando o paradigma ganha mas não leva".
Eduardo Chulam é sócio do escritório Chulam Advogados
Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações

TST começa a aplicar súmula sobre convenção coletiva

Dois antigos trabalhadores da extinta Brasil Telecom, hoje Oi, conseguiram garantir o pagamento de participação nos lucros para aposentados, previsto em cláusula da convenção coletiva de 1969, que não teria sido expressamente revogada em negociações posteriores. Os ministros do órgão máximo do Tribunal Superior do Trabalho (TST), a Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1), aplicaram ao caso a nova redação da Súmula nº 277, alterada em setembro. O texto diz que os benefícios concedidos aos trabalhadores passaram a integrar os contratos individuais, serão automaticamente renovados e só revogados se houver uma nova negociação.
Se esse entendimento prevalecer nas próximas decisões da Corte, o impacto sobre as empresas poderá ser imenso, segundo advogados trabalhistas. Isso porque as companhias terão de pagar aos trabalhadores que entrarem na Justiça valores referentes a benefícios antigos, não expressamente cancelados.
Apesar desse julgamento, há ministros no TST que entendem que esse novo entendimento só poderá ser aplicado nas novas convenções e acordos coletivos, firmados após setembro deste ano, quando a súmula foi modificada. Essa solução é conhecida no meio jurídico como modulação dos efeitos e poderia diminuir o impacto dessa alteração.
É o caso da 4ª Turma, onde os ministros foram unânimes ao decidir a favor da Ferrovia Centro Atlântica, sucessora da Rede Ferroviária Federal (RFFSA), hoje Vale. No processo, um ajudante de maquinista pedia a manutenção de parcela, suprimida pela RFFSA em 1999, relativa a horas de viagem, previstas em uma antiga norma regulamentar que não teria sido cancelada.
Segundo o relator do processo, ministro Vieira de Mello Filho, a alteração da jurisprudência "deve ser sopesada com o princípio da segurança jurídica". Isso porque a Corte alterou significativamente seu entendimento ao revisar a súmula. Nos últimos 24 anos, o entendimento do próprio TST foi o de que as vantagens negociadas entre empresas e trabalhadores valeriam enquanto vigorasse o acordo, no prazo máximo de um ou dois anos, conforme a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Para mantê-los em uma próxima convenção era necessária nova rodada de negociação.
O advogado, professor de direito do trabalho da USP e membro do Conselho Superior de Estudos Jurídicos da Fecomercio, Cassio Mesquita Barros, afirma que o tribunal ratificou a súmula nesse julgamento da SDI-1. "O que é uma flagrante ilegalidade, já que não existem cláusulas eternas, conforme prevê a própria CLT ao dar validade máxima de dois anos a esses acordos", diz. Para ele, essa interpretação é "muito perigosa" e pode ter um impacto enorme sobre as empresas. Porém, segundo Barros, "as companhias farão uma campanha ferrenha contra a aplicação desse texto".
A Fiesp encaminhou ao presidente do TST uma representação contra essa súmula e outras editadas recentemente. A Corte, no entanto, ainda poderá mudar esse posicionamento, pelo menos com relação à aplicação dessa súmula a casos anteriores. "Até porque muitos dos ministros não concordam com essa aplicação", afirma Barros.
Como no caso analisado pela Subseção I, a nova redação da súmula foi imediatamente aplicada sem que houvesse qualquer discussão, a advogada Carla Romar, professora de direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), também levanta a possibilidade de que os ministros possam tratar do tema com mais profundidade em outros julgados. Isso poderia ocorrer porque a relatora, ministra Delaíde Miranda Arantes, apenas manteve a decisão da 2ª Turma contra a Brasil Telecom por entender que estaria em sintonia com a nova redação da Súmula 277 do TST. Sem oposições, os ministros não conheceram o recurso por unanimidade.
Para Carla, se as turmas começarem a julgar pela não aplicação da súmula nas convenções ou acordos antigos, a discussão poderá ser novamente suscitada na SDI-1, responsável por uniformizar o entendimento sobre o tema. A advogada relembra que a alteração da Súmula nº 277 teve votação acirrada entre os ministros. Foram 15 votos a favor da nova redação e 11 contra. O texto ainda foi aprovado sem que houvesse precedentes, requisito necessário, conforme o regimento interno do TST. Já para as próximas convenções e acordos coletivos, a advogada afirma ter diversas palestras agendadas para o ano que vem sobre o tema. "Muitas companhias já não vão querer dar novos benefícios."
O juiz do trabalho Rogério Neiva Pinheiro também acredita que a SDI-1 ainda possa retomar o tema e ao menos modular a aplicação da súmula. Apesar de ainda não ter julgado ações sobre essa questão após a edição do novo entendimento, Neiva afirma que está preocupado com o número de litígios que possam surgir, caso não haja uma limitação pelo TST. "Os advogados podem fazer um levantamento dos benefícios que foram perdidos e pleiteá-los na Justiça", diz.
Procurada pelo Valor, a assessoria de imprensa da Ferrovia Centro-Atlântico informou que a empresa prefere não se manifestar. A assessoria de imprensa da Oi não retornou até o fechamento da edição.